A formação permanente na SEDF: tempo de mudanças?

12 de março de 2013



A responsabilidade ética, política e profissional do ensinante lhe coloca o dever de se preparar, de se capacitar, de se formar antes mesmo de iniciar sua actividade docente. Esta actividade exige que sua preparação, sua capacitação, sua formação se tornem processos permanentes. Sua experiência docente, se bem percebida e bem vivida, vai deixando claro que ela requer uma formação permanente do ensinante. Formação que se funda na análise crítica de sua prática. (Carta de Paulo Freire aos Professores)”


Recentemente, o professor Mário Bispo publicou o texto “Por uma política de estado para a seleção e formação de educadores” no Blog do Washington Dourado, na qual expõe sua preocupação com a formação dos/as professores/as e orientadores/as educacionais que atuam (e/ou vão atuar) na Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SEDF). No seu texto, ele argumenta a favor de algumas mudanças nos processos seletivos para professores/as que vão atuar na SEDF, seja os processos simplificados para professor/a temporário, seja nos concursos públicos. 

Dentre essas mudanças, o professor Mário Bispo destaca que os conteúdos dos processos seletivos simplificados e dos concursos públicos estão muito aquém do que se espera em uma seleção de profissionais de educação (professor/a e orientador/a). Cobram-se conteúdos como “direito administrativo com uma ênfase exagerada em processos legais em detrimento do item relativo ao próprio regime jurídico dos servidores públicos” (p. 1). Além disso, a prova de atualidades não faz “nenhuma questão concernente às atualidades educacionais” (p. 1). 

Outro ponto, talvez o mais polêmico, é em relação à falta “de provas discursivas e provas práticas em um concurso para professor” (p. 1), tal como ocorre em outros Estados brasileiros. O professor Mário Bispo questionou por que são exigidas provas práticas para os candidatos de língua estrangeira e música e não se faz essa mesma exigência para os/as candidatos/as aos cargos de Sociologia, Filosofia, Artes, Matemática, Atividades, dentre outros. Talvez por conta do que ele mesmo argumenta a favor: por falta de uma política de estado para a seleção e formação de educadores.

Em seu texto, concordo com seus posicionamentos sobre os conteúdos previstos nessas provas, ou a falta de conteúdos que talvez devessem ser priorizados em invés de outros. No entanto, não me arrisco a dar minha opinião sobre as provas práticas (ainda), pois vejo que é uma discussão atual, pelo menos no âmbito do DF e ainda não tenho uma posição definida em relação a isso. Contudo, concordo que a SEDF tem uma “cultura institucional própria”, com muitos documentos, diretrizes e práticas que precisam ser incorporadas pelos/as novos/as professores/as e pelos professores/as em regime de contratação temporária.  

Por isso mesmo que venho “endossar o caldo” e ampliar as reflexões que o professor Mário Bispo fez, mas no sentido de refletir sobre a formação permanente desses/as professores/as. Mesmo que a ideia de formação permanente seja válida para superar as concepções de formação inicial e continuada (como destaquei na frase do Paulo Freire, lá no ínicio), vou focar mais na formação continuada (estamos acostumados/as a pensar nessa divisão!), visto que foi esse o tema que me despertou maior aflição e indignação nesses últimos tempos. Começarei pela formação ofertada pela EAPE para os/as novos/as professores/as nomeados/as e, por último, falarei sobre os cursos aceitos para progressão na carreira do Magistério Público do Distrito Federal. 

Inicialmente, considerei a proposta de formação dos/as novos/as professores/as nomeados/as louvável. Como disseram no próprio curso de formação, estes/as novos/as professores/as estão tendo o privilégio de fazer um curso de formação antes de entrarem na regência de classe, o que não ocorreu com muitos/as outros/as professores/as efetivos/as. De fato, o curso foi positivo, embora muito questionável também.  Quebrando minhas expectativas de formação, confesso assustei-me quando soube que o curso era só de 20 horas. Não apenas eu, outras colegas também[1]. Aí a primeira pergunta é: 20 horas são ideais para formar um/a professor/a?

Minhas expectativas eram que o curso tivesse mais horas (pelo menos 30 horas, para já contar na progressão por mérito) e que as reflexões fossem ampliadas em um ambiente virtual de aprendizagem, em que os/as novos/as professores/as pudessem debater mais sobre a legislação, direitos e deveres, orientações pedagógicas diante de situações problemas, a política educacional adotada pela SEDF, entre outros assuntos[2]. No entanto, para completar a minha decepção, além da carga horária ser ínfima, a atividade “online” disponibilizada para cumprir às 8 horas restantes da formação se resumiu no estudo do Projeto Político Pedagógico (PPP) Professor Carlos Mota e do PPP da unidade escolar. E o mais problemático a meu ver: fizerem duas questões objetivas e uma questão dissertativa para “avaliar esse estudo”

Aí pergunto, como o professor Mário Bispo, e amplio: como desenvolver a “habilidade (prevista nas normas da SEEDF) de redigir projetos que favoreçam o desenvolvimento pessoal e social do\a aluno\a", se a própria SEDF exige, na própria formação que oferece, que se dê “qualquer tipo de resposta” em uma atividade que deveria envolver estes/as novos professores/as e exigir uma reflexão mais aprofundada?

Por fim, gostaria de falar sobre os cursos para a progressão na carreira do Magistério Público do Distrito Federal. Vejamos o que diz o artigo 31 da Portaria Nº. 255, de 12 de dezembro de 2008, que disciplina sobre a aplicação da Lei nº. 4.075, de 28 de dezembro de 2007, que dispõe sobre a Carreira Magistério Público do Distrito Federal:

31. Os cursos de atualização, aperfeiçoamento e formação aceito s para fins de concessão da progressão por mérito serão ofertados pela EAPE, instituições de ensino superior devidamente reconhecidas pelo MEC, entidades classistas  representativas dos servidores da Carreira Magistério Público do Distrito Federal, bem como por instituições credenciadas pela Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal”.
31.1. Os cursos de que trata o item 31 devem perfazer um total de 180 (cento e oitenta) horas, sendo que pelo menos um curso deverá ter carga horária mínima de 90 (noventa) horas e os demais de, no mínimo, 30 (trinta) horas.
31.1.1. Para completar as 180 (cento e oitenta) horas previstas no subitem 31.1, o servidor poderá utilizar certificados de cursos, congressos, conferências e seminários, desde que os mesmos tenham carga horária mínima de 30 (trinta) horas.


Olhem só! Talvez esteja me metendo onde não devia (muit@s amig@s vão me falar isso, eu já sei!). Claro que como todo/a e qualquer professor/a, interesso-me pela progressão na carreira, principalmente, devido às recompensas financeiras e, também, claro, pelas vantagens de ser um/a professor/a bem qualificado/a. No entanto, fiquei muito triste em descobrir como é o modelo da maioria dos cursos de formação continuada para professores/as de grande parte das instituições credenciadas pelaSecretaria de Estado de Educação do Distrito Federal. Antes de qualquer coisa, quero salientar que tenho experiência na área de educação á distância e formação especializada e acredito que a educação à distância não é “moleza”, como muit@s pensam. Em alguns casos é até mais “puxada” que o presencial. 

Dito isso, percebi que os cursos ofertados pelas instituições credenciadas pela Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal são baseados no modelo de educação à distância, porém no modelo que predominou na primeira geração da EAD, em que existiam os cursos por correspondência: você compra o material de estudo, estuda e marca X nas questões avaliativas. Não é que aqui, e lá no curso que falei de formação da EAPE, volta à pergunta feita pelo professor Mário Bispo: será que uma prova objetiva de marcar X é suficiente para avaliar o domínio de tais capacidades? 

Concordo que muitos cursos podem ser feitos nesse modelo, pois são cursos de domínio teórico, voltados a aquisição de conhecimentos. Porém, nos cursos voltados para a aquisição de competências e habilidades, como os cursos da área de educação especial e inclusiva, fiquei pensando de novo: como pode um curso de marcar X lhe habilitar para assumir uma turma de Transtornos Globais do Desenvolvimento (TGD), por exemplo? 

Infelizmente, é isso que acontece. Como uma amiga me disse: “é o famoso apostilão”. Diante dessas questões, começo a entender porque muit@s professores/as desistem de fazer cursos de formação “continuada” que exigem uma reflexão aprofundada sobre determinados conteúdos: pois são cursos que “cobram” demais, são “puxados”. Para que me dedicar a um curso, se eu posso comprar um apostilão? Então, também considero fundamental repensar a formação!


[1] Embora alguns se questionaram da proposta da atividade “online” do curso, que se resumia em perguntas simples, duas objetivas e uma dissertativa, outros colegas gostaram. Como disseram na Comunidade dos Professores Aprovados, “ótimo, menos trabalho kkkkk” (professora), ou “Eape, bah, todo mundo faz este curso. Chato e enrrolativo” (professor).
[2] Minha colega de trabalho que foi empossada no ano passado disse-me que o curso que fez de ingresso na carreira também não foi legal, pois eram feitas perguntas para os/as formadores/as no ambiente virtual e elas não eram respondidas. Parece-me que no ano passado utilizaram o ambiente virtual e talvez por essa problemática e por outras que não sei, decidiram não utilizar esse modelo neste ano de 2013.