Ciclos barrados pela Justiça

8 de julho de 2013



Decisão da 5ª Vara de Fazenda Pública determina que o GDF pague R$ 10 mil diariamente caso qualquer instituição de ensino mantenha a organização curricular sugerida pelo governo no início do ano. Sinpro afirma que há escolas aplicando o método



Manoela Alcântara
Publicação: 05/07/2013 18:00 Atualização: 05/07/2013 10:30

Reunião do Conselho de Educação, no início do ano, discutiu os ciclos e a semestralidade: sem apoio do Sindicato dos Professores (Daniel Ferreira)

Reunião do Conselho de Educação, no início do ano, discutiu os ciclos e a semestralidade: sem apoio do Sindicato dos Professores

Suspensa desde fevereiro por decisão judicial, a nova organização curricular das escolas da rede pública por ciclos de aprendizagem, para o ensino fundamental e, em semestralidade, para o ensino médio, pode gerar prejuízo aos cofres públicos. Começa a valer em 10 dias a decisão da Justiça de cobrar multa diária de R$ 10 mil caso qualquer instituição de ensino mantenha o sistema sugerido pelo governo no início deste ano. A decisão determina que a multa comece a ser aplicada 20 dias após o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, e o secretário de Educação, Denilson Bento da Costa, serem notificados. Isso ocorreu em 20 e 21 de junho e o documento foi anexado ao processo no dia 24, data em que começa a contar o prazo.

A ação foi movida pelo Ministério Público do DF e dos Territórios por meio da Promotoria de Justiça de Defesa da Educação (Proeduc). Depois de longas deliberações, a decisão foi proferida pela 5º Vara de Fazenda Pública do DF. De acordo com a assessoria de imprensa do MPDFT, a Justiça determinou e a multa será executada, caso haja alguma irregularidade. A constatação de tal descumprimento só poderá ser avaliada após 29 de julho, quando acabam as férias da rede pública.

No entanto, a polêmica começa desde agora. A Secretaria de Educação (SEDF) afirma ter cumprido a decisão judicial. “A SEDF suspendeu a implementação dos ciclos e a semestralidade nas escolas públicas do Distrito Federal”, informou, por meio de nota, a assessoria de imprensa. A pasta ressaltou ainda que pretende firmar um termo de ajustamento de conduta (TAC) com o Ministério Público para definir melhor a situação.

O Sindicato dos Professores do DF (Sinpro), por sua vez, cita nominalmente escolas que mantêm as mudanças curriculares. De acordo com o diretor da entidade de classe, Washington Dourado, mesmo com a decisão judicial, houve a implementação. “O Centro de Ensino Fundamental 106 do Recanto das Emas, a maioria das escolas do Plano Piloto, de Ceilândia e todas as escolas classes mantêm o ensino por ciclos. A semestralidade também. E, pior, fora dos padrões que eles mesmos se propuseram a ter”, garantiu o diretor. Dourado ressaltou que não houve contratação ou nova estrutura. “Eles apenas deixaram de reprovar os alunos até o 5º ano. O resultado disso virá mais para frente, quando o conteúdo desses estudantes for cobrado”, disse.

Ação judicial

No plano inicial do governo, o Currículo em Movimento da Educação Básica extinguia o ensino seriado até o 5º ano. A intenção era ampliar o Bloco Inicial de Alfabetização (BIA), que ia até a 3ª série desde 2005, para os dois anos subsequentes. Logo, os estudantes só estariam passíveis de reprovação em provas realizadas no 3º e no 5º anos. No ensino médio, a proposta era a organização por semestres. As aulas passariam a ser divididas por áreas de conhecimento: nos primeiros seis meses do ano, o aluno aprenderia exatas e, nos outros seis, humanas, por exemplo.

Porém, a sociedade e entidades de classe alegaram não ter havido a discussão e a preparação necessárias para tais mudanças. O Ministério Público moveu ação e a Justiça decidiu suspender a implementação. Na última decisão, a 5ª Vara teve o entendimento de que “cabe ao Poder Judiciário o controle sobre os atos de autoridades, de modo a impedir que seja retirado do povo o poder efetivo de agir ou de delegar a seus representantes as decisões normativas. Dirigentes os quais têm o dever e a incumbência de debater e decidir sobre as normas a serem adotadas em questões graves e delicadas como a educação de nossos filhos”, resume o processo.

Planejamento

A intenção inicial do governo era implantar os ciclos em pelo menos cinco regionais: Santa Maria, São Sebastião, Recanto das Emas, Núcleo Bandeirante e Guará. Até 2014, o sistema seria ampliado para todas. A principal alegação para a mudança era melhorar o rendimento escolar. Entre as mudanças previstas, seriam traçadas estratégias pedagógicas com o acompanhamento de psicólogos; a separação dos alunos em turmas, de acordo com os níveis de conhecimento de cada um, entre outros. Para o ensino médio, estavam previstos aulas no contraturno e reforço escolar.

A proposta do GDF 
Veja as mudanças que a Secretaria de Educação pretendia implantar na rede pública de ensino:
CICLOS

O sistema já funciona do 1º ao 3º ano do ensino fundamental no DF desde 2005. É chamado de Bloco Inicial de Alfabetização (BIA). Os alunos instalados nesse modelo são avaliados com frequência, mas sem reprovação. Somente no último ano do ciclo é que eles estão sujeitos à retenção. De acordo com a ideia da Secretaria de Educação do DF, o BIA seria ampliado para o 4º e o 5º anos do ensino fundamental. Assim, o estudante só poderia ser retido no avanço para a 6ª série. Não haveria mudanças do 6º ao 9º ano. O ensino continuaria seriado, com avaliação anual, com possibilidade de retenção, caso o aluno reprove.

SEMESTRALIDADE

No ensino médio, o currículo continuaria a ser seriado, mas as disciplinas seriam divididas por semestres. Na metodologia tradicional, os alunos têm até 19 matérias ministradas durante todo o ano letivo. Com as mudanças definidas pela política educacional, o ensino seria reorganizado por áreas de conhecimento. Se o estudante fosse aprovado em uma disciplina, ele teria três chances para melhorar. Seriam duas recuperações ao longo do semestre no qual a matéria é ministrada e mais uma no fim do ano. O aluno ainda avançaria de série por meio da dependência. Ele poderia reprovar em até duas matérias e ir para a série seguinte com o compromisso de recuperar a nota nas disciplinas anteriores.

Adoecimento é quase "epidemia" entre professores


"Eu cheguei no limite de travar na porta da escola e disparei a chorar, olha a situação"



Notícia publicada na edição de 06/03/13 do Jornal Cruzeiro do Sul, na página 020 do caderno A - o conteúdo da edição impressa na internet é atualizado diariamente após as 12h.



De repente o sonho de ser professor e compartilhar conhecimento com estudantes aos poucos se desfaz. O processo de desilusão é lento e gradual, porém a certeza de que já não dá mais para continuar é percebido quando, logo na ida para o trabalho, o coração começa a disparar, a sensação ruim aumenta e simplesmente esse professor, que outrora almejou tanto estar naquele local, simplesmente não consegue entrar na escola. "Eu cheguei no limite de travar na porta da escola e disparei a chorar, olha a situação", conta, emocionado, um professor da rede estadual de ensino de Sorocaba, que preferiu não se identificar para não ser prejudicado.

Esse professor conta que adorava lecionar, mas que o sistema de progressão continuada o desgastou. "Quando o governo implantou, nós professores nos sentimos meio acuados porque o fato de não poder reprovar os alunos levou muitos estudantes à indisciplina. Tem alunos que vão à escola sem caderno, então você se sente um fantoche, uma marionete, porque não tem autonomia. A verdade é que na escola estadual você se sente um nada. Afinal por que estou aplicando provas, dando trabalhos, se o aluno não vai se empenhar? Estou fazendo isso à toa", desabafa o professor. Para ele, o que aconteceu é que o profissional da área perdeu o respeito. "Como se não bastasse tudo isso, para aplicar provas o professor tem ainda de tirar dinheiro do bolso porque a escola não tira as cópias necessárias", relata.

Salário baixo, ausência de um plano de carreira e a agressividade por parte de alunos indisciplinados são outros fatores que, somados, causam um desgaste muito grande. "Tudo isso deixa a gente muito pra baixo. Sou pós-graduado, tenho 25 anos de profissão, adoro o que faço e acabei entrando em depressão. De sete anos para cá peguei aversão de escola", lamenta, profundamente desapontado com o momento que está vivenciando.

Ele conta que por motivos de doença, passou a usar todas as faltas a que tem direito. "Tirei as faltas abonadas e as faltas médicas, já cheguei a ter quatro, cinco faltas por mês. Isso fazia com que eu deixasse de ganhar bônus e também a escola, mas enfim. O sistema é responsável por tudo o que estou passando".

Uma pesquisa divulgada pela Apeoesp em 2010 revela que 48,5% dos professores do Estado de São Paulo sofrem com estresse e 26,6% com depressão. Mais de 40% dos profissionais declarou que sente-se cansado, sobrecarregado, emocionalmente exausto, muito cobrado pelas pessoas, frustrado, com vontade de mudar de profissão e sem perspectiva de futuro, sintomas atribuídos à Síndrome de Burnout. A pesquisa ainda mostra que 34,4% dos professores declararam que precisaram se afastar ao menos uma vez da sala de aula por razões de doença sendo que, dentre eles, 42,5% por males ligados diretamente à ocupação.

Em Sorocaba, somente no ano passado, 2.067 professores da rede estadual foram afastados por motivos de doença e 189 professores readaptados, conforme informações da Secretaria de Gestão Pública do Estado.


Pesquisador defende o abolicionismo escolar


Danilo Ferreira de Camargo, mestre em Educação pela USP, analisa essa situação vivenciada por uma parcela significativa de professores da rede pública de ensino em sua dissertação de mestrado, onde discorre sobre o tema "O abolicionismo escolar: reflexões a partir do adoecimento e da deserção dos professores".

Sob orientação do professor Julio Roberto Groppa Aquino, Danilo teve acesso, ao longo de quatro anos, a mais de 60 trabalhos acadêmicos que tinham como tema o adoecimento dos professores. Conforme ele, os problemas da realidade escolar deveriam ser entendidos como resistência política à ordem estatal e não apenas como patologias ou desvios morais dos professores e alunos. Para Danilo, as pessoas deveriam aprender a questionar não os problemas da escola, mas a própria existência dela como um grave problema político.

Para ele, talvez esteja na hora de começar a duvidar da naturalidade da escola e de sua correspondente ordem social. Em entrevista para o Educare, Danilo explica mais sobre a questão:

O que faz o professor adoecer por conta do ambiente escolar? Li em seu trabalho que seria uma forma de resistência. Poderia explicar melhor isso?

No meu trabalho eu analiso o surgimento de uma "epidemia" das doenças ocupacionais relacionadas à carreira docente, assim como o aumento considerável da deserção docente nas escolas brasileiras. A principal patologia seria a exaustão física e emocional, classificada pela literatura médica como síndrome de Burnout. A minha hipótese inicial era a de que os problemas da escola são respostas políticas ao problema da "condução da conduta" dos agentes escolares e não meramente um problema de "crise" da escola contemporânea e dos valores que ela representa. Para tanto, tentei demonstrar que o problema do adoecimento docente é a manifestação atual de um velho problema: o da insuportabilidade da rotina escolar. Essa insuportabilidade, por sua vez, está diretamente ligada à invariância da escola e a forma como ela confina os nossos corpos com o intuito de produzir um sujeito autogovernado a partir dos comandos políticos do Estado.


Você fala que a insuportabilidade escolar se estendeu ao corpo docente com uma força impressionante e que o silêncio é uma forma de protesto também. Nesse caso faltar, adoecer, é uma forma de mostrar que algo não vai bem. Mas afinal, o que é que não vai bem na escola? Por que isso acontece?

Acredito que não devemos mais ficar procurando o que está errado na escola. O que me parece curioso é que a escola é criticada desde o seu surgimento e, no entanto, ela não para de se expandir. Hoje, mais do que nunca, a escola está por todos os lados e já não conseguimos escapar de sua clausura, de seus rituais, de seus valores. Minha pesquisa almejou questionar o triunfo inabalável da estrutura escolar e sua expansão saturante em nosso meio social. O objetivo principal foi escapar do grande paradoxo da estrutura escolar: criticamos quase tudo o que se passa na escola (os alunos, os professores, os conteúdos, os gestores, os políticos) e, ao mesmo tempo, desejamos mais escolas, mais professores, mais alunos, mais conteúdos e disciplinas. É preciso reconhecer, antes de qualquer coisa, que as mazelas da escola são muito rentáveis e parecem se proliferar na mesma medida em que proliferam os diagnósticos e os prognósticos para uma possível cura. Em geral, todos os discursos sobre os problemas da escola retroalimentam-se dos próprios diagnósticos que fazem circular com a indefectível legitimidade de suas intervenções. A minha questão é outra: será possível não mais tentar resolver os problemas da escola, mas compreender a existência da escola como um grave problema político?


Em seu trabalho você fala sobre o abolicionismo escolar e cita que em todas as suas pesquisas ninguém ousa questionar a existência da escola, todos querem melhorá-la mas não querem que deixe de existir como instituição. Por quê?

O filósofo francês Gilles Deleuze certa vez declarou: "Se as crianças conseguissem que seus protestos ou simplesmente suas questões fossem ouvidas numa escola maternal, isso seria o bastante para explodir o conjunto do sistema de ensino". Essa constatação simples nos assusta porque o que está em jogo é a forma como naturalizamos uma instituição que se tornou o grande fundamento de nossa civilização. Dessa forma, questionar a existência da escola é transgredir o limite do nosso enunciado político. Não é por outra razão que todos os protagonistas presentes no jogo dos discursos escolares (pesquisadores, professores, sindicalistas, jornalistas, juristas, governo), não obstante aleguem um estado crônico de crise da escola, parecem falar, pensar e agir motivados por um desejo comum: a hiper-potencialização das práticas escolares. Tentei em meu trabalho analisar esse limite político do nosso universo sociocultural. Isso porque acredito que a explicitação desses limites, talvez, pode dizer mais sobre nós mesmos do que toda essa rede discursiva que pretende diagnosticar medicamente, denunciar politicamente e solucionar administrativamente o mal-estar da escola contemporânea.

Como seria uma sociedade sem escolas?

No meu trabalho, tentei chamar atenção para o fato de que, do século XIX ao início do XXI, nenhuma reforma educacional, teorizada ou praticada, modificou substancialmente a rotina do cotidiano escolar no que tange ao sequestro dos corpos infantis e ao controle rigoroso do espaço e do tempo a que estão submetidos todos aqueles que são escolarizados. Apesar das aparentes modificações ao longo do tempo (da palmatória ao palmtop), a escola é uma instituição que parece conservar sua essência já há muito naturalizada: todos os dias, uma legião de crianças, dotadas de um número de matrícula, um uniforme, um caderno de notas, são confinadas por algumas (ou muitas) horas no interior de salas de aula, sob a supervisão de um professor, para que possam ocupar o tempo e aprender alguma coisa. Essa é a realidade que temos, e ela nos parece tão natural que não conseguimos sequer imaginar como seria um mundo sem essa tecnologia de governo da infância. Ninguém pode dizer como seria um mundo sem escolas, mas imagino que no futuro não conseguirão imaginar direito como eram as sociedades com escolas.

Se não tivesse escolas hoje, onde ficariam as crianças e adolescentes enquanto os pais trabalham?

Essa pergunta revela o verdadeiro papel da escola: um depósito de crianças e adolescentes para garantir a força produtiva do Estado. A pergunta, então, deveria ser: por que não paramos de reproduzir as idílicas utopias escolares? Por que não encaramos as escolas como de fato são: carceragens deprimentes para onde enviamos todos os dias uma multidão de crianças? No que se refere aos impasses da escola no mundo atual, acredito que o mais importante é escaparmos da denúncia moral sobre os benefícios ou aspectos nocivos da estrutura escolar e encará-la como ela realmente atua. No mais, gostaria de dizer que talvez não possamos mais, por muito tempo, escaparmos de um fato concreto: a escola é insuportável e o preço desse insuportável social tem sido a violência que, ora aqui, ora ali, irrompe das piores formas. E antes que você me pergunte qual a solução, eu só teria a dizer que devemos começar a duvidar das soluções escolares que são vendidas todos os dias com as mais diversas intenções e pelos preços mais variados.

Pedagogia da paulada

6 de julho de 2013





Parece violenta... 

Talvez seja... 
Um pouco behaviorista possível...  
Algo como:
Reforço positivo ou negativo!


A pedagogia da paulada é conhecida!
Já estamos acostumados a presenciá-la, quando falamos de educação...
E de relação entre "pais" e filhos"...
Fez errado apanha...
Fez certo, talvez, um elogio.

Hoje, escutei essa expressão... 
Me veio uma mistura de humor, mas também de compreensão....
Não é isso que se costuma fazer? 
Não me diga que não...

A pedagogia da paulada de certa forma ensina... 
Especialmente a não repetir aquilo que é não. 

Pode ser dolorida... 
E pode parecer das cavernas...
Mas, às vezes, faz efeito... 
Outras vezes, não. 

(Inspirações da madrugada, após um dia de muito trabalho - na tutoria e na sala de aula)